Antecedentes da libertação de Moçambique
Introdução
O presente trabalho tem como tema: “ As lutas de libertação de Moçambique”. A escolha do mesmo prende-se ao facto de procurar conhecer em que condições decorreu a libertação desta pérola do indico, as causas que levaram ao triunfo da sociedade moçambicana. Para a elaboração do trabalho cingimo-nos fundamentalmente à análise documental de fontes oficiais: livros, revistas, artigos e documentos do Arquivo Histórico Militar, de sites credíveis da Internet, trabalhos de investigação fidedignos, fontes audiovisuais que se enquadram no contexto político-militar de Moçambique.
Tomando como partida a questão fundamental acima apresentada, surgiram diversas perguntas com vista a desenvolver a sustentabilidade da questão central: O que originou a reunião dos grupos de moçambicanos que defendiam a luta anti-colonial e a independência de Moçambique e como harmonizaram as suas posições para se juntarem numa única Frente de Libertação Moçambicana (FRELIMO)?
Antecedentes da libertação de Moçambique
A ocupação efectiva de Moçambique por parte do Estado colonial português encontrou uma forte resistência do Povo Moçambicano que, organizado de diversas formas opôs-se à dominação que lhe era imposta. Em toda a extensão do território moçambicano, diversos estados e povos negaram, pacificamente, a subjugação, erguendo-se em diversas formas de resistência, pois, mais do que a exploração do Homem e dos recursos naturais, a fixação estrangeira implicava a descaracterização dos autóctones por via da desvalorização e/ou banimento dos seus conhecimentos e tradições seculares, em suma, a sua História Cultural. No entanto, apesar da sua audácia, as primeiras formas de resistências foram todas elas vencidas.
“O Estado Colonial Português em Moçambique foi, na ponta das baionetas, montado para servir os diversos interesses do capital internacional. Toda legislação publicada entre o fim do século passado e 1930 destinou-se a amordaçar os moçambicanos no estreito e desumano perímetro da sua condição de ‘indígenas’ e de trabalhadores forçados. Por isso e para isso o Estado Colonial usou mais os aparelhos repressivos e menos os aparelhos ideológicos” .
Dois grandes factores ditaram o fracasso destes levantamentos: a superioridade bélica do colonizador e, sobretudo, a falta de coesão entre o povo moçambicano, que vezes sem conta foi intencionalmente criada pelo colonialismo. A partir da segunda metade do século XX, o colonialismo português passou a usar métodos mais sofisticados que incluíam estratégias de incitação à divisão dos chefes locais, conquistando apoio de alguns e ganhando vantagens militares em relação às unidades políticas mais resistentes. Esta estratégia culminou com a queda das resistências, dentre as quais se destacaram o Império de Gaza, em 1895, o Estado de Bárue, em 1918, e a última em 1920, no Planalto dos Makonde.
Como consequência, a ocupação do território moçambicano tornou-se efectiva o que permitiu a implantação da administração colonial portuguesa (Tembe, 2014).
Economicamente frágil, Portugal adoptou uma estratégia de colonização virada fundamentalmente para a satisfação das necessidades de capitais internacionais, alienando o nosso País as potências coloniais mais fortes. A forma de acumulação de capital usada por Portugal nesta altura foi a venda de mão-de-obra para as economias agrárias e mineiras da região, bem como a concessão de terras e desenvolvimento de portos e prestação de serviços ao capital estrangeiro, sobretudo britânico que explorava as colónias da Rodésia do Sul e Norte, e a África do Sul. Para assegurar a produção interna, Portugal desencadeou o uso de força de trabalho em regime coercivo e a cobrança de impostos a população, conhecida na legislação colonial como “Indigenas”. Mondlane (1995:37), refere-se a este aspecto sublinhando que “entre 1890 e 1910 ficaram definidas as principais características do colonialismo português: uma rede administrativa centralizada e autoritária; a aliança com a igreja católica; a utilização de companhias, muitas vezes estrangeiras para explorar os recursos naturais; o sistema de concessões; trabalho forçado; e exportação em grande escala de trabalhadores para a África do Sul”.
Adam (2000:387), destacou: “O sistema do chibalo foi montado com base na pilhagem e
utilização abusiva do campesinato. Forçado a trabalhar para poder pagar o imposto e evitar a prisão, o trabalhador foi engajado sem direitos de espécie alguma. O pagamento dos salários
podia ser diferido ou negligenciado por períodos longos, segundo o capricho dos patrões; alguns proprietários rurais adoptaram a táctica de maltratar os trabalhadores no último mês de trabalho de modo que, se eles fugissem, evitavam, assim, pagamentos de qualquer ordem”.
A situação de exploração e opressão conduziu ao recrudescimento do sentimento de revolta contra o regime colonial português. Com efeito, a partir da década de 1930, começaram a observar-se manifestações populares e de trabalhadores em oposição ao sistema. A título de exemplo, como forma de manifestação contra as culturas forçadas do algodão e do arroz, os camponeses passaram a cozer as sementes, reduziram as áreas de produção e abandonaram as suas aldeias. Merece menção a ascensão do movimento operário das plantações e do sector ferroviário. Tais foram os exemplos das greves da Açucareira de Xinavane, em 1949 e dos estivadores dos portos de Lourenço Marques, da Beira e de Nacala. Estas últimas, ao longo dos anos, tiveram um carácter sistemático tendo ocorrido em 1948, 1956 e 1963.
Perante as crescentes ondas de contestação, o regime colonial endureceu a sua máquina repressiva contra o povo moçambicano. As perseguições, prisões, maus tratos e torturas levadas a cabo pela Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE) em colaboração com o exército colonial aumentaram de intensidade. O extremo destas barbaridades aconteceu em Mueda, a 16 de Junho de 1960, quando um grupo de moçambicanos dirigiuse à administração local para, de forma pacífica, reivindicar a liberdade e justiça social. A reunião tinha sido convocada pelo administrador alegadamente para responder as reivindicações dos camponeses da Sociedade Agrícola Africana e Voluntária de Moçambique e da União Makonde que pediam o fim do trabalho forçado, a autorização para abertura de lojas cujos donos fossem negros e, a venda livre e a preços aceitaveis de alguns produtos agro-pecuários (Tembe, 2014).
A resposta colonial a esta acção pacífica não poderia ter sido mais fatal. Centenas de cidadãos foram barbaramente assassinados. Como anteriormente mencionado, a acção colonial portuguesa em Moçambique foi marcada por uma intensa revolta cujo cúmulo ocorreu com o Massacre de Mueda a 16 de Junho de 1960. Importa, pois, analisar factores de ordem estrutural que na década de 50-60 teriam galvanizado este movimento até atingir a forma de Movimento de Libertação Nacional.
RESISTÊNCIA: A PROCURA DE UM MOVIMENTO NACIONAL
Eduardo Mondlane afirma que como todo nacionalismo africano, o de Moçambique nasceu da experiência da colonização europeia. A fonte de unidade nacional foi o sofrimento comum durante a primeira metade do século vinte sob o domínio português. Segundo o autor, “o movimento nacionalista não surgiu numa comunidade estável, historicamente com uma unidade linguística, territorial, económica e cultural”. Em Moçambique, “foi o domínio colonial que deu origem à comunidade territorial e criou as bases para uma coerência psicológica, fundada na experiência da discriminação, exploração, trabalho forçado e outros aspectos da dominação colonial”.
Contudo, a comunicação entre as comunidades separadas que estavam sujeitas a este tipo de experiência, era limitada. Todas as formas de comunicação provinham anteriormente do topo, por intermédio da administração colonial. Isto, segundo Mondlane, atrasou o desenvolvimento de uma consciência única em todo o espaço territorial. Em Moçambique, a situação foi agravada pela política do “Portugal Maior”, em que a colónia era considerada província de Portugal, e todas as pessoas consideradas portuguesas pelas autoridades.
Em muitas áreas onde a população era reduzida e muito dispersa, o contacto entre a potência colonial e o povo era tão superficial que poucos eram os que tinham uma experiência pessoal da dominação. Como observa Eduardo Mondlane, havia alguns grupos no Niassa Oriental que nunca tinham visto um português antes do início da guerra de libertação nacional. Nessas áreas, as pessoas não tinham a noção de pertencer nem à nação nem à colónia, e foi-lhes bastante difícil a princípio compreender o significado da luta. A chegada do exército português rapidamente alterou esta situação.
A CAMINHO DA UNIDADE:
Eduardo Mondlane mostra que tanto a agitação dos intelectuais como as greves da força trabalhadora urbana estavam destinados ao fracasso, porque em ambos os casos resultavam da acção de um pequeno grupo isolado. Para um governo como o de Portugal, que se opunha à democracia e que estava disposto a utilizar métodos extremamente brutais para esmagar a oposição, não era difícil lidar com estes núcleos isolados de resistência. No entender desse nacionalista, foi o próprio fracasso destas tentativas e a feroz repressão que se lhe seguiu que puseram em evidência a ineficiência das acções isoladas e prepararam o terreno para uma acção a nível mais amplo. Já que a população urbana de Moçambique não ultrapassava meio milhão de habitantes, Mondlane reconhece que um movimento nacionalista sem raízes firmes no campo dificilmente teria sucesso.
Segundo Mondlane, alguns acontecimentos, que tiveram lugar nas zonas rurais no período imediatamente anterior à fundação da FRELIMO foram de grande importância, como o massacre de Moeda por exemplo, em 1960, onde cerca de 500 pessoas foram mortas a tiro pelos portugueses, fazendo com que muitos daqueles que até então nunca tinham pensado no uso da violência passassem a considerar a resistência pacífica como inútil. Após o massacre a situação no norte de Moçambique nunca mais voltou ao normal. Por toda parte “foi a própria severidade da repressão que criou as condições necessárias para o desenvolvimento de um movimento nacionalista forte e militante”.
As primeiras tentativas de criar um movimento nacionalista de âmbito nacional foram levadas a efeito pelos moçambicanos que trabalhavam nos países vizinhos, onde estavam fora do alcance imediato da PIDE23. No início, segundo Mondlane, a falta de comunicação levou à criação de três movimentos separados: UDENAMO (União Democrática Nacional de Moçambique), formada em 1960 em Salisbury (hoje Harare-Zimbabwe); MANU (Mozambique African Union), formada em 1961, a partir de vários pequenos grupos já existentes entre os moçambicanos trabalhando na Taganhica e Quênia, sendo um dos maiores o Mozambique Makonde Union; UNAMI (União Africana de Moçambique Independente), fundada por exilados da região de Tete que viviam no Malawi em 1961. Mondlane diz que o acesso de várias antigas colônias à independência no final dos anos 50 e início de 60 influenciou a formação desses movimentos de “exilados”, e a independência da Tanganhica (hoje Tanzânia) em 1961, abriu novas perspectivas para Moçambique.
Em 1961, aumentou a repressão em todos os territórios portugueses após a revolta em Angola, o que causou uma afluência de refugiados aos países vizinhos, particularmente à Tanzânia. Estes exilados recém-vindos do interior, muitos dos quais não pertenciam a nenhuma das organizações já existentes, exerceram uma forte pressão para a criação de uma única organização. Como mostra Mondlane, as condições externas também favoreceram a unidade: a Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas (CONCP) realizada em Casablanca (Marrocos) em 1961 e na qual a UDENAMO participou, fez um apelo vigoroso à unidade dos movimentos nacionalistas contra o colonialismo português.
Assim, a 25 de Junho de 1962 os três movimentos existentes em Dar-es-Salaam (Tanzânia) fundiram-se para formar a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e iniciaram-se preparativos para a realização de uma conferência em Setembro do mesmo ano, que iria definir os objetivos da Frente e traçar um programa de ação. Segundo Eduardo Mondlane, os moçambicanos que se reuniram em Dar-es-Salaam em 1962 representavam quase todas as regiões de Moçambique e todos os setores da população. “Quase todos tinham alguma experiência de resistência em pequena escala e tinham sofrido as represálias que normalmente se seguiam”.24 Tanto dentro como fora do país, segundo Mondlane, as condições eram favoráveis à luta nacionalista.
A acção armada contra a colonização portuguesa teve início em 25 de setembro de 1964.25 Mondlane argumenta que a ausência de qualquer oposição ao uso da força foi um dos fatores que contribuiu para ter havido um período tão curto entre a fundação da FRELIMO em 1962 e o começo da luta armada.
Na História do Povo moçambicano, a fundação da FRELIMO, em 25 de Junho de 1962, marca o início de uma fase qualitativamente diferente da nossa luta contra a exploração e opressão colonialistas. Com a fundação da FRELIMO esta luta passou a ser diferente porque, baseada em toda a história do nosso povo, a FRELIMO proclamou a unidade do Povo moçambicano do Rovuma ao Maputo como sendo um factor essencial para a vitória contra o colonialismo português.
Organizado e dirigido pela FRELIMO, o Povo moçambicano, finalmente unido do Rovuma ao Maputo, desencadeu a luta armada de libertação nacional em 25 de Setembro de 1964. Após dez anos de guerra popular, o colonial-fascismo foi derrotado no nosso país e conquistada a nossa independência nacional. Em 25 de Junho de 1975 foi proclamada a República Popular de Moçambique, fruto da resistência do nosso povo contra todas as formas de exploração, Estado de trabalhadores para trabalhadores.
Conclusão
Chegado ao término do presente trabalho, diremos apenas que todo o processo histórico, compreendendo factores internos e externos, levou à promulgação de uma nova Constituição da República em 1990, a mesma que introduziu a economia de mercado e o multipartidarismo. Aqui “a afirmação da personalidade moçambicana, das suas tradições e demais valores socioculturais”,44 passou a constituir um dos objectivos fundamentais da República de Moçambique. Isto significa que a ideologia segundo a qual as diferenças étnicas em termos de cultura e poder que deveriam ser substituídas para que um espírito de unidade nacional fosse concretizado, encontra hoje o seu reverso dentro da legalidade e dos mecanismos da Constituição.
A 25 de Setembro de 1964, deu-se início ao processo de construção de Moçambique, como uma nação livre e independente, com o lançamento da Insurreição Geral Armada contra a ocupação
estrangeira. Na altura, os moçambicanos unidos e guiados pela Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), decidiram Lutar pela Libertação da Terra e do Homem Moçambicano. A Unidade Nacional, determinação e perseverança dos moçambicanos logrou os seus intentos quando a 25 de Junho de 1975, Moçambique declarou a sua Independência Nacional, conquistando o pleno direito de País Livre e Soberano no concerto das nações.
Bibliografia
- www.semnegativa.blogspot.com
- ADAM, Yussuf. O Sul e o Trabalho Migratório. In História de Moçambique. Volume 1. U.E.M. Maputo: Livraria Universitária, 2000.
- MONDLANE, Eduardo Chivambo. 1995. Lutar por Moçambique. Maputo: Nosso Chão, 1995,
- SERRA, Carlos. O Estado Colonial Português em Moçambique. In História de Moçambique. Volume 1. U.E.M. Maputo: Livraria Universitária, 2000
Encomende já o trabalho!
+258 84 67 22 756
Meubloguer@gmail.com